domingo, 20 de abril de 2008

P.S. Nunca mais é tempo demais

É meia-noite e tal, estamos quase em Maio - há três anos e tal que te conheci - a estação do ano de que mais gosto, é de noite e, como sempre, ainda não tenho sono. Estou cansada, é só. É meia-noite e tal, quase uma da manhã, desisto definitivamente de esperar por ti.
Não me posso despedir de ti, nem sequer um "boa noite*", porque não estás aqui, despeço-me de ti porque desisto e não preciso dizer-to, há muito que sabias que seria assim.
Falaremos ainda algumas vezes, talvez, por hábito apenas. Entre nós, ficam apenas vagas imagens desfocadas e mal fotografadas e uma indiferença cruel.

"Até amanhã." - como costumas dizer, sabendo que esse "amanhã" já não existe mais.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Pausa inter-relato

Roubam-nos a voz.
Roubam-nos o corpo.
Roubam-nos a primazia alegórica.
Rasgam-nos a roupa, a máscara e o véu.
Sugam-nos até ao eco dos ossos.

domingo, 6 de abril de 2008

Perdas de tempo

Fechar as portas. Para sempre. A tudo e todos. A sangrar da boca. Os lábios encarnados, decorados com um fio de sangue. Por dentro também. Uma hemorragia interna. As pessoas mentem. Muito. Os ossos como a desfazerem-se (se calhar é só impressão, não houve fracturas). Até que ponto o que os outros inventam sobre nós nos atinge? Só se lhes abrirmos alguma porta. A sensação de asfixia. Talvez uma situação de esmagamento interno. Uma rede de intrigas, invejas, falhas, desconexões e vazios. O peixe que lá entrar ou torna-se tubarão ou é morto por eles. Um golpe abaixo dos pulmões, a pele rasgada e um fio de sangue a deambular pelo corpo. Os tubarões amam sangue. Fechar a porta e ficar offline para sempre. Não há fracturas expostas. A pulsação está quase normalizada. A tensão arterial abaixo do normal. Um peixe perdido no mar. Mentiras. São dotadas de um egoismo preferencial. Não é só isso. É o deserto interior, a inveja e a ignorância. Olhos fechados. O lábio inferior com marcas de sangue. Antes do choque, mordia o lábio. Talvez para conter o choro. Um (des)afecto involuntário. São estátuas de carne e osso encharcadas de cicuta como peixes no mar. Um mundo inabitável. Soro. Imobilizador. Agulhas. Desinfectante. Ligaduras. Algodão. Mentem. Inventam. Fazem intrigas. Porque são menores, pequenas, minúsculas. Porque o silêncio e o desprezo as faz sentirem-se ainda mais insignificantes. Falam porque pensam que o que dizem interessa a alguém. Todos? Não, só alguns. Algumas nódoas negras. Uma hemorragia a descobrir-se. Sem uma única palavra ou gesto. Diagnóstico: em coma. Fechar as portas. Para sempre. A tudo e todos (só alguns).

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Labirinto de espelhos

"Era minha 'obrigação'."
Era?
TUA?
Obrigação?
Obrigação?!

A música chegou ao fim. Começa outra, uma música nova.

«Ela senta-se no chão, no meio de um labirinto de espelhos. As paredes invisíveis enfeitadas com fitas de origamis coloridos. Ele não está lá (Está mas ela não o consegue ver, nunca). Esconde-se, esconde-se do outro lado do espelho. Ela esconde-se. Mas ele também não a procura. Ela encolhe-se com os joelhos contra o peito, as mãos vincadas nas pernas até se formar uma imagem una, a sua imagem espalha-se pela sala como um origami colorido. Um origami. Uma gaiola de ferro de onde só se ouve um bater de asas desesperado. Ela espera. Não pode sair dali. Perdeu-se no labirinto de si própria. Custa-lhe respirar. Os pulmões contra o coração, apertados entre os joelhos e o abraço. Não quer que ninguém a oiça. Mais uma noite. Ele não virá outra vez. Se calhar também se perdeu. (Ele nunca se perderia, tem no mapa dos ossos milhares de setas. Nem sequer sabe o que é um labirinto).»


Não preciso da tua 'obrigação', um origami bem recortado em papel de seda chamado desprezo. Prefiro o teu silêncio.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Fragmentos da mais bonita (Ir)realidade

Tantas vezes as palavras cortavam laços entre nós e rasgavam véus invisíveis, um coração pintado de vermelho, como nas imagens reais, com suaves facadas de vergonha. No abismo da memória, as fotografias baralhavam-se como cartas de naipes diferentes, perderam-se no tempo e guardam-nos em livros e cadernos, fragmentos de momentos. Perdi as datas e os momentos especiais (quase todos) algures entre a tinta e o papel, algures dentro de mim, dentro de nós, porque ficariam para sempre. (Ficaram? Acho que sim). Já não os sei de cor, mas vejo-os, são o prelúdio e o fim desorganizados num fio de memória.
3 anos e o medo no que seria a melhor fotografia. É sempre o medo que nos atraiçoa.
Tantas vezes te dizia que as tuas palavras, por vezes, eram como flocos de gelo, tantas vezes não entendias. Agredias-me com flocos de neve, gritavas nessa tua forma inocente e doce, nesse teu silêncio sem rosto.
3 anos e histórias inventadas por gestos e sons. Sempre nos entendemos sem palavras ouvidas, mas há sempre um limite e o nosso espaço de mímica tornou-se num abismo. Entre um lado e o outro, cresce o silêncio e o vazio, a ausência e um fio de fumo a desaparecer ao longe. Somos nós, as nossas fotografias, as minhas e as tuas, as palavras e as músicas.
E nenhuma fotografia nos une no mesmo retrato...